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Os Versos Pontiagudos de Di Mc Krânio Loko

Jeff Ferreira
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Em agosto de 2018 o rap nacional ganhou mais uma contundente obra pra sua coleção, o EP Versos Pontiagudos, terceiro trabalho solo do Di Mc Krânio Loko, direto da Vila Elza, na cidade de Viamão, no Rio Grande do Sul. Com produções assinadas por Felipe Djazz e vários scratchs do DJ Tuca, que também chegou junto com um beat para o projeto.

O disco tem oito faixas que, de modo geral, transitam sobre questões sociais do Brasil ao mesmo tempo que traz uma critica a nossa sociedade e governantes, tem a missão de se manter positivo, levando uma mensagem de aleto aos seus ouvintes. O álbum também traz participações especiais de Black A.K. e JMR Contenção, que somam no peso desse trabalho.

A capa do disco “Versos Pontiagudos”, saiu do clipe “Monstro Sem Freio”, de uma das seções de fotos para o vídeo, feitas pelo Big John, da Bigg’s Produções, da cidade de Cachoerinha, e remete ao conceito de sobrevivendo em meio ao caos, num mondo radioativo, de pessoas toxicas, buscando uma saída pra não se contaminar ou até mesmo de ser a cura para esse vírus.

O disco abre com “Acapela”, e aqui o MC descarrega sua voz potente sem um instrumental, num flow cantado e com uma variação mais melódica. Krânio Loko nos mostra seu talento vocal abordando seu corre, que tem a alma do underground, sem se preocupar com quantidade, mas a qualidade da mensagem para quem ouve, para que a aí haja esperança de mudança.

“Não vou usar o dom que Deus me deu pra massagear ego de prego
Ou agradar fariseu, se meu rap fere o seu, não é minha intenção
Só não consigo me aliar com inimigo e passar ilusão
Pra quem me ouve, se são poucos não me abalo
Se apenas um entendeu o que falo, já valeu a pena”

A faixa dois é a que dá nome ao álbum “Versos Pontiagudos”, já em cima do peso das caixas Di MC vem com uma letra pra incomodar, separar o joio do trigo, e mostra que a caneta é a arma para essa situação, além de falar sobre o posicionamento mesquinho da sociedade, que como o rapper cita é “chicoteados no lombo, e o pior é que aplaudem o carrasco”. Ainda vale citar a ótima referência ao clássico “H.Aço”, do grupo DMN.

A politicagem anda dominando até, quem se dizia militante hoje é irritante a fé
Sendo comercializada tipo marfim de elefante
Raridade são aqueles que nunca te deixam a pé
Na avenida, na hora que tu precisa
Desculpa é o que mais tem a culpa é de quem? Me diga...
A culpa é de quem mendiga, espaço e atenção
Argumento do olho gordo a inveja é arma do cão
Ser pai não é só pagar pensão
Fora aqueles que nem paga e ainda se orgulha da prisão”

Na música três, Di MC chega com tudo, sobe o tom, pois “a boca fala do que o coração ta cheio”, e coloca pra fora o sentimento de indignação que tem com o estado e toda classe politica e suas atrocidades com o povo, desde a mitificação de bestas ao assassinato de Marielle Franco, são temas que engasgados que construíram esse “Monstro Sem Freio”. Destaques para os riscos do DJ Tuca, com colagens de clássicos do rap nacional.

Engorde o gado, e leve pro abate
Nos consideram números, peças descartáveis
Na mão de energúmenos, ricos miseráveis
Assassinos que ainda recebem homenagem
Liberte-se, dessa contaminação
Sistemática que trampa com a imbecilização
Da civilização, formadores de amébas
Estupidos que não andam com as próprias pernas”

Video clipe de "Monstro Sem Freio"

Seguindo temos “Seja Bem Vindo”, onde a poesia do Krânio Loko, em seu refrão com flow cantado, traça um paralelo do Brasil, entre suas belezas e a forma como mata seus próprios filhos, através da violência, trafico de drogas, hipocrisia alcoólatra e descaso politico e midiático, como o lamentável episodio envolvendo o jornalista Boris Casoy.

O sistema aplaude quando cai mais um de nois aqui
Na periferia depósito esquecido
De propósito é o propósito, dos políticos
Aquecidos e enriquecidos, com a mão de obra escravizada
Verbas desviadas das escolas
E o que sobra é a sobra da sobra da sola do sapato
Na base da pirâmide no trâmite dos rato
E o povo engole sapo paga pato e pega pah herói
Abre "uzói" e " ói" só o que fez o Boris Casoy”

Na faixa cinco, “O Que Tá Acontecendo”, Black A.K. divide os vocais com Di MC, numa música para ressaltar o poder de transformação que o rap tem, pois vivemos numa sociedade completamente perturbada, e nossas crianças crescem em meio a isso, um trecho de uma canção com compromisso, que traz a reflexão, pode recrutar um ser humano e “matar” um futuro bandido ou dependente químico.

“tipo crianças com o dedo na tomada
um mc que escreve um som
é responsa dobrada irmão
uma palavra pode fazer o camarada tirar a mão
do perigo evitando um grande choque
esse é o intuito do verdadeiro hip hop”

Em “Terrores Noturnos”, temos um beat mais tenso, que ajuda a transmitir a atmosfera de agonia e debates com os demônios internos. Aqui Krânio Loko se apresenta mais introspectivo e direcionando a critica a si mesmo, algo incomum nos tempos de egotrip do rap nacional. Aqui além de linhas pesadas, o MC dispara humildade e consciência.

“Não existe delete, reverbera toda merda que eu fiz e ainda fede
Tenho que lidar com isso, arcar com tudo que fiz
A voz vem no meu ouvido e sussurra...
Tu que quis...
E a consequência de toda essa demência
É a tonelada na consciência
Cabeçadas dadas as cegas pelas macegas adegas bregas e becos nos tempos de adolescência
Que se seguiram pela idade adulta
E no tempo devido vem a multa”

Escrever Sobre O Que?”, essa é a pergunta que Di Mc faz na penúltima faixa do álbum, com beat de DJ Tuca, onde voz, bumbo e caixa dão o ritmo numa levada pra cima, apesar de abordar as tantas pesedo-justificativas para se desistir e jogar tudo pro alto, a letra traz o alerto de como é importante ser resistência em meio a isso, se manter firme, vivo e com fé, destaque para a construção da letra, com várias frases de efeito e jogos de palavras, mostrando a destreza e elevação do nível.

“Gurizada morre precoce com talento a lapidar
E sem lápide, quando foram lá pedir reivindicar direitos choque veio agredir
Querem que... Sejamos um aglomerado de tontos
Com professores ganhando trezentos contos!
Nas facul de Toronto os boy se forma é Canadá
Pelas ruas da quebrada o crime forma e cana dá
Paradas assaltadas povo indo trabalhar
De manhã cedo sai com medo não sabe se vai voltar...”

O disco fecha com aquele boombap bonito e pesado em “Ele É Justiça”, com participação de J.M.R. Contenção, e que como o próprio rapper versa vai na contramão da maré, trazendo a mensagem de é mais da hora ser um mano firmeza do que igual a muitos vacilão que tem por ai. A música, a começar pelo seu titulo, aborda de fé e da justiça divina, outro tema que faz falta no rap nacional, independente de religião, pois os MC’s creem em si próprio, em seu próprio ego, não que isso deva ser desse ou daquele jeito, mas que o ego inflado tornou o rap chato isso é um fato, e Krânio Loko veio pra diversificar a cena, com lealdade e humildade.

“De quem corre pelo certo, batalha sempre honesto
A postura nunca muda, na lama na chuva ou no sol do deserto
Armadilha nenhuma vai prosperar pó para
O que vale é a sinceridade, pra Deus me amparar
E me proteger de qualquer ataque invisível
Aprender ter mais fé no Deus do impossível
Ninguém vai nos deter tchê”

Di Mc Krânio Loko com seu trampo Versos Pontiagudos prestou um excelente e preciso trabalho ao Hip Hop, voltando a sua essência de informar e conscientizar, trazendo a tona aquilo que é o quinto elemento da cultura, o conhecimento, e por falar em elementos, é importantíssimo a presença do DJ Tuca no álbum, além ser a cereja do bolo com os scratchs, voltamos ver a belíssima parceria entre o DJ e MC, que está cada vez mais escasso dentro do Rap BR.

Apesar dessa atmosfera de princípios do Hip Hop e letras de conscientização, Krânio Loko não veio passar sermão e trouxe um disco divertido, com construções de frases complexas, brincando com as palavras a medida que transmite seu conhecimento. Sem dúvidas esse é um álbum pra ficar no repeat por tempo indeterminado.

Abaixo você acompanha o trampo no Spotfy:



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